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The original was posted on /r/portugal by /u/Maleficent-Pilot-908 on 2024-11-06 12:18:55+00:00.


Venho fazer uma exposição que ganha contornos de desabafo, pedido desesperado de auxílio e apresentação do mundo real Tal como infelizmente é nas suas dinâmicas e não aquilo que aparece na TV e meios de comunicação.

Não sou o único que já publicou aqui sobre a mesma situação essencialmente, com ligeiras e naturais nuances aqui e ali, mas essencialmente o mesmo.

Depois de uma sequência particularmente infeliz de catástrofes familiares (venho de classe sócio-económica média-alta mas não é só no seio de agregados pobres e iletrados que há disfuncionalidade), com mortes prematuras, problemas do foro psiquiátrico de irmãos com que lidei sozinho (“amigos” é muito lindo quando está tudo “bem”, quando precisamos desaparece tudo - toda a gente sabe disto mas é mesmo verdade), a saúde mental em Portugal é, como em praticamente todos os campos e serviços, terceiromundista.

Portanto já sei que vão achar que sou demasiado articulado e culto e inteligente bla bla para estar nesta situação, mas precisamente aí reside um dos pontos fundamentais de um sistema mais que podre e uma espécie quase totalmente hipócrita, individualista, gananciosa, desumanizante.

Não sou de esquerda nem direita nem adiro a dogmas políticos, e vou até abster-me de manifestar as minhas (vincadas) posições sobre imigração, o estado da Europa, o estado de Portugal, etc. Estou farto de falar disso com gente que não vale a pena nem percebe realmente do que está a falar ou tem a opinião baseada no que vê no conforto dos seus lares na TV e no politicamente correcto.

Para evitar rótulos e problemas e discussões, vou mesmo abster-me totalmente de dar sequer indícios da minha muito bem substanciada posição sobre esses temas (embora em parte indirectamente contribuam para a situação em que estou), e honestamente estou demasiado cansado já emocional e mentalmente para isso… Aqui seria talvez o lugar ideal, mas decidi escrever aqui pela primeira vez talvez já demasiado tarde.

Faço-o agora em desespero “controlado” (porque já estou habituado e perder a cabeça não resolve nada, felizmente tenho essa capacidade, outros decentes e honestos em situação senelhante que não a têm mais tarde ou mais cedo enlouquecem ou suicidam-se, etc).

Perdi os pais, família, casa, bens pessoais, tudo. Catástrofe total. Já há muitos anos. Sou sem-abrigo. Já estive do lado de lá (desse lado) e não censuro quem tem uma ideia pré-concebida deste segmento da população, até porque na maioria corresponde à verdade.

Tudo o que disse e direi é por infeliz experiência em primeira mão - quem me dera não saber do que estou a falar.

As IPSS (abrigos temporários para onde enviam desgraçados com problemas com drogas, do foro psiquiátrico, pessoas idosas que a familia não quer, etc) são meros esquemas para sacar (muito) dinheiro à Segurança Social. Não há excepções. Os funcionários não têm quaisquer qualificações para lidar com este tipo de casos construtivamente. Por cada cabeça o dono recebe muito dinheiro da SS, mas funciona tudo à base de donativos. O dinheiro vai para o bolso desse criminoso/a, que nem lá põe os pés excepto para ver se o sistema de vigilância (câmaras, caríssimas, não para a treta da “segurança dos utentes” mas para controlar os funcionários qué geralmente roubam e ficam sempre com o bom que é doado e o que em última análise chega ao prato sem condições dos utentes é o que sobra disso, os restos.

A SS não tem capacidade nem recursos humanos nem vontade para fiscalizar as condições desses sítios - em muitos há roubos, violência, maus tratos de todo o tipo excepto sexuais, que eu saiba). A verdade é esta. Estive em dois ou três depois de arrancar uma vaga a ferros e é assim que funciona.

A linha 144 é uma piada, há um indivíduo a atender centenas de chamadas em linha de espera que faz uma série de perguntas - depois de meia hora à espera numa cabine rodeado de barulho sem sequer poder sentar-me, sou atendido (se a chamada não for abaixo, que geralmente é o caso) por uma técnica que faz… exactamente as mesmas perguntas, para no fim dizer para voltar a ligar e dizer quase invariavelmente que não há vagas nesses antros em lado nenhum do Norte (e não só). Porque está tudo cheio de drogados com o RSI e PSI e isto e aquilo, etc. A “reabilitação”, “autonomização” e “acompanhamento” são tretas. Toda a gente encara esses postos como um mero emprego, como em qualquer lado só querem paternalizar e chegar ao fim do turno e ao fim do mês, fim-de-semana e férias. Estão-se a borrifar para as pessoas, a tal minoria que quer mesmo reabilitar-se e só pede o mínimo de condições para poder trabalhar e voltar a ser independente sem chatear ninguém. Os outros são casos perdidos.

Mas nem para aí há vagas, as que arranjei antes foi porque fui à PSP e aí o tipo de resposta da SS/144 já é outra. Mas isso não é trabalho da polícia e eu respeito a autoridade e a missão deles e não os vou massacrar para fazerem o trabalho de assistentes sociais com crime e violência a toda a hora, cada vez mais, nem que seja para umas noites numa cama rodeado de lixo humano, que faz mesmo toda a diferença (questão já de vida ou morte) passado tempo que chegue…

Acostumamo-nos a ouvir “vai mas é trabalhar”, 'tens bom corpo para trabalhar ", "não queres é trabalhar ", etc. E aprendi a ignorar porque não posso desperdiçar a já pouca energia que tenho a irritar-me a tentar em conversas inúteis mudar a mentalidade pré-formada de pessoas random com argumentação que demorava tempo. Nem serviria de nada. É ignorar e pronto. Nem todos conseguem, é preciso algum estoicismo. Felizmente tenho-o. Senão estava morto há muito, por força da violência das ruas que ninguém devia sofrer na pele, nem os criminosos, nem devia saber que existe, ou por desgaste (tentando tudo de forma honesta e levar só patadas em todos os cantos e todas as portas a que bato com o tempo faz-nos questionar se vale a pena continuar a tentar… e com menos disciplina e organização, com desleixe, alguém que não gosta da rua nem é drogado nem tem apoio do estado nem de ninguém não sobrevive muito tempo, e morrendo ninguém quer saber, portanto é mesmo bom que não desista totalmente e se mantenha firme, senão definha rápido até motrer e nem a funeral hipócrita tem direito, só removem o corpo para não dar mau aspecto - literalmente).

Eu não tenho sequer a miséria do RSI porque não tenho técnica/o, por incompetências e burocracias muito típicas dos serviços básicos neste ex-país, porque foi suspenso quando estava num abrigo em Braga (suposta regra, mas não se aplica a todos). Nesses sítios já de si miseráveis onde está tudo à mercê de gente geralmente sem escrúpulos e hipócrita que só está ali para ganhar o seu e se está a borrifar para as pessoas assim que chega o fim do turno e já deu de comer aos “porcos”, quem manda não gosta lá muito de pessoas que ainda pensam e têm julgamento crítico, preferem drogados ou gente com Alzheimer ou iletrados que não percebem onde estão sequer e portanto não topam os podres - esses ficam lá anos; os que não chateiam ninguém e aproveitam uma cama e comida e um tecto para procurar trabalho ou pelo menos formações (outro esquema para uns criminosos ficarem bem vistos pela sociedade que não serve para absolutanente nada excepto dar uns trocos a desgraçados numas aulas em que muitas vezes só aparecem para assinar e se fica a falar da vida pessoal).

Casa? Quarto? Como devem saber, da maneira que isto está (é um problema já humanitário em plena Europa Ocidental, mas não é fielmente retratado na CS), os preços estão simplesmente impossíveis.

Já lá irei, mas ficam já com a conclusão final: quem por qualquer motivo perde casa e não tem família/amigos/quem lhe deite a mão… não importa se é inteligente, culto, honesto, trabalhador: é praticamente impossível sair do buraco. As barreiras e obstáculos são constantes, diários, em cada canto, cada passo, cada tentativa, e com o tempo começa-se a deixar de tentar com o mesmo vigor e perde-se a esoerança. A verdade é esta. Parece lógico, mas é mesmo assim: sem um sítio “nosso”, uma cama, descanso, alimentação adequada e suficiente, outras necessidades básicas, até alguma privacidade mínima, higiene decente sem ter que percorrer quilómetros e fugir, hipervigilante, aos picas no metro, é impossível ganhar alguma estabilidade duradoura. Uma noite/dia na rua rebenta com uma pessoa.

Como se não bastassem os elementos e privações, há o elemento humano (violência, drogas, etc., e a polícia está-se a borrifar para os sem-abrigo, se se matam uns aos outros, nem somos gente, e acreditem que eles como toda a gente metem tudo no mesmo saco, com conselhos inúteis, insultos, patadas, “vai mas é trabalhar”, etc).

Na situação extrema em que estou (nunca fui suicida e prezo muito o privilégio de estar vivo de forma consciente, mas não tenho prazer, conforto ou paz absolutanente nenhuma e racionalmente já pensei com cada vez maior frequência em acabar comigo, por razões puramente racionais, nada de desequiíbrio emocional…), se tivesse o RSI não estava a dormir no metal rodeado de dezenas de drogados violentos e pedintes sem qualquer dignidade ou privacidade, ia passar una ou duas noites nalgum sítio barato para trocar de roupa e dormir como deve ser, etc., isto se encontrasse sítio que não estivesse lotado, o que também é muito difícil já). O resto sobrava e geria para aquilo para que isso original/inicialmente foi criado: um empurrão para quem está mesmo a 0. Não tenho porque não t…


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